“O Jornalismo é talvez a única profissão em que somos testados diariamente, a cada instante. O jornalista tem por obrigação ser inteligente durante pelo menos o seu horário profissional”. Lago Burnett.

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Segmentação na Comunicação Impressa

As primeiras publicações brasileiras, durante os períodos do primeiro e segundo impérios, eram mais voltadas para política e negócios e, obviamente, direcionadas para a elite, já que uma minoria da população sabia ler, tinha dinheiro para a compra dos jornais e se interessava por esses assuntos.
Após 1850, a imprensa brasileira passou por transformações “o jornalismo político deu lugar à “imprensa do romantismo”, os pasquins foram substituídos por jornais mais estáveis, de maior duração”. (Lima. 2002:39).
Na área de produtos e serviços jornalísticos, a segmentação, ainda que rudimentar, teve início ainda no século XIX, com a criação de revistas ilustradas, dirigidas a um segmento mais crítico e culto, publicações dirigidas aos estrangeiros que vieram ao Brasil substituir a mão-de-obra escrava, publicadas muitas vezes na língua nativa desses estrangeiros; além de publicações marginais e artesanais de cunho ideológico.
No início do século XX, pode-se notar uma nova forma de segmentação nas publicações, assim como roupas e sapatos direcionados para público feminino, masculino e infantil.
As publicações femininas tratavam basicamente de culinária, moda, alguns aspectos de decoração e cuidados com o lar, além de assuntos como criação de filhos e harmonia doméstica. A revista “A Cigarra”, que ditaria moda na década de 1970 e que trouxe durante toda a década de 1940 folhetins encartados em suas páginas, foi fundada em 1914. A “Revista feminina”, fundada em 1915, foi uma das principais revistas para esse público. O público infantil era prestigiado com a publicação “Tico-tico” (1905).
Já as publicações masculinas abordavam aspectos financeiros, política e outros assuntos mais específicos para negócios. Além dos jornais, eram publicados diversos títulos de revistas, desde sátiras, críticas e de caricaturas, passando por assuntos de interesse geral como “Revista da Semana”, (1900) e “Leitura para todos” (1905).
Mas, assim como os produtos de uso pessoal, como roupas e sapatos, com os produtos jornalísticos/informativos não é suficiente a segmentação por sexo ou idade, já que um mesmo produto não consegue satisfazer aos anseios e necessidades de todos os consumidores. É necessário que se faça uma segmentação mais personalizada e direcionada por preferências, hábitos, gostos e necessidades.
A semana de Arte Moderna, realizada em fevereiro de 1922, em São Paulo, não chegou a merecer destaque da imprensa, no entanto, foi responsável pela criação de revistas como “Revista de Antropofagia” (1928) e “Klaxom” (1922) direcionadas aos intelectuais de esquerda do período. A revista “O Cruzeiro”, uma das mais importantes da nossa história, foi fundada em 1928 e durante as décadas de 40 e 50 seria um dos principais veículos de informação nacional. As ditaduras de Getúlio Vargas (1930-1945) e do governo militar (1964-1985), bem como a introdução das mídias eletrônicas no Brasil - rádio (1922) e TV (1950) - acabaram sendo em parte responsáveis por uma estagnação nesse processo de segmentação das empresas de comunicação brasileiras.
Ao mesmo tempo, diversas publicações americanas passaram a ser editadas no Brasil, trazendo suas influências sociais, culturais, políticas e econômicas ao nosso País. Na década de 1950, receberam versões em português, publicações de grande circulação nos Estados Unidos. Em assuntos gerais, a revista “Seleção” de Readers Digest, no segmento infantil, as revistas de Walt Disney e, duas décadas mais tarde, na área feminina, a revista “Cosmopolitan”, rebatizada aqui com o nome de “Nova”.
Ainda na década de 50, os grandes jornais criaram os suplementos semanais sobre assuntos diversificados, como suplementos femininos, esportivos, literários, entre outros. Esse fenômeno não se restringiu apenas aos jornais. “ As revistas também apresentaram inovações, com diversificação de matérias e algumas especializadas a dar suporte a outros meios de comunicação, como o rádio e o cinema. Foi o caso da Revista do Rádio, Radiolândia e Cinelândia.” (Lima. 2002:39).
Em 1959, a editora Abril, lança a revista “Manequim”, a primeira revista de modas já com moldes prontos; em 1960, lança “4 Rodas”, especializada em turismo e automóveis e “Diversões Escolares”, direcionada a crianças em idade escolar. Em 1961 lança as revistas “Futura Mamãe”, “Noiva Moderna” e “Cláudia”, tentando atender a mulher em suas principais necessidades. Em 1963, lança a revista “Intervalo”, sobre TV e “Transporte Moderno”, sua primeira revista técnica.
A segunda metade da década de 60 seria de grandes inovações para a editora Abril, desde o lançamento das revistas “Realidade” (1966) e “Veja” (1968) e a infantil “Recreio” (1969), até a febre das publicações em fascículos, passando por enciclopédias de assuntos gerais, específica de saúde, de trabalhos manuais, culinária, obras de arte, música, personalidades da história, ciências, entre outros.
Durante toda a década de 70 e 80, as publicações de fascículos continuaram, com temas como cientistas, mitologia, geografia, história, religiões, sexual, plantas, entre outras . Além disso, surgiram diversas outras revistas segmentadas: “Placar” - esportiva - (1970), “Pop” - primeira revista destinada a adolescentes - (1972), “Homem” - revista masculina - (1975), “Casa Cláudia” - decoração - (1977), “Ciência ilustrada” – assuntos científicos - (1981), “Saúde” - sobre qualidade de vida - (1983), “Nova Escola” - direcionada a professores e educadores - (1986), além de diversos títulos de história em quadrinhos, de autores nacionais e internacionais, e outras publicações infantis.
Na segunda metade da década de 80, a editora Abril passa a enfrentar a concorrência da editora Globo, cria a Editora Azul para produzir publicações segmentadas e entre 1987 e 1988 lança pela Abril diversos títulos para nichos bem específicos “Guia Rural”, “Fluir”, “Set”, “Arquitetura e Construção”, “Superinteressante”, “Esportes e Náutica”, “Boa Forma”, “Sala de Aula” e “Elle”.
Para acompanhar essa segmentação das revistas, na década de 80, os jornais entraram em uma fase denominada de “cadernização”, ou seja, a segmentação de assuntos por cadernos ou publicações específicas com temas como informática, turismo, decoração, rural, veículos, entre outros.

O alvo ao alcance dos produtos

A segmentação dessas publicações que vieram ocorrendo ao longo das últimas três décadas, possibilitou não apenas uma expansão para o mercado editorial, mas também uma facilitação para o mercado publicitário que pôde otimizar a utilização de sua verba de mídia e obter um retorno qualitativamente melhor para suas inserções publicitárias.
Por menor que seja o nicho atendido por cada uma dessas publicações ou cadernos, sua representatividade para inserção de anúncios publicitários deve ser analisada pela homogeneização do perfil dos consumidores, o que torna a mídia segmentada um grande atrativo para determinados produtos ou marcas, já que a linguagem utilizada nessa publicidade pode ser bem direcionada, explorando signos pertencentes exclusivamente a esse nicho de mercado.
Os benefícios de se trabalhar com mídia segmentada estão além da otimização dos recursos financeiros, já que criar uma peça publicitária específica para um grupo de pessoas que compõem um target específico possibilita melhor interação com esse público, maior credibilidade e identificação com a mensagem e, conseqüentemente, maior possibilidade de retorno com essa campanha ou peça publicitária.
A revista Raça Brasil, por exemplo, com suas editorias de beleza e moda, tornou-se uma excelente opção mercadológica para os fabricantes de produtos de beleza que já haviam percebido a força desse mercado e vinham investindo nesse segmento com produtos específicos para pele e cabelo dos afro-descendentes.
Marcas conceituadas de produtos que durante muitos anos ignoraram o grande contingente de consumidores negros passaram a investir em produtos específicos para esse público, obtendo retorno financeiro em curto espaço de tempo.
A linha editorial da revista incentiva, de certa forma, o consumo dos mais diversos produtos ao mostrar as novas possibilidades que o mercado oferece a esse segmento e ao incentivar os leitores a aproveitarem tudo que lhes é oferecido. Não é à toa que esse nicho de mercado tem se mostrado tão atraente aos fabricantes de produtos e ao segmento publicitário, dados do Banco Mundial apontam que o mercado de afro-brasileiros e afro-americanos é composto por mais de 100 milhões de pessoas e ultrapassa o potencial de US$ 800 bilhões, só os afro-brasileiros superam a marca de 79 milhões de pessoas e respondem por um consumo de cerca de US$ 300 bilhões.
A revista Update relata que a agência publicitária Grottera, em 1997, realizou uma pesquisa sobre o perfil dos consumidores afro-descendentes que vivem nos centros urbanos brasileiros, os resultados encontrados apontam para uma fatia da classe média pouco explorada no mercado de consumo e cuja demanda por produtos específicos estava latente.
Os dados relatados contabilizavam 7 milhões de pessoas com esse perfil, com renda anual de R$ 46 bilhões e a valor mensal para consumo de R$ 500 milhões. Como exemplo, é fornecido o mercado de cosméticos, onde esse segmento movimenta 25% das vendas de um total de R$ 6 bilhões por ano.
Os anunciantes da revista Raça Brasil, no entanto, não são compostos apenas por empresas com produtos étnicos, mas também de empresas que estão interessadas em aumentar seu faturamento conquistando esse filão com potencial até há pouco ignorado, como bancos, prestadoras de serviços entre outras.

LIMA, Sandra Lúcia Lopes. Comunicação e época. São Paulo: Catálise, 2002.

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